segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

A Pregação dos Puritanos

Por Joel R. Beek

O pregador puritano era doutrinador. A mensagem puritana não pedia desculpas por apresentar doutrina. O puritano não temia pregar todo o conselho de Deus para o povo. Os puritanos achavam que você não podia contar uma história qualquer, sem que esta tivesse doutrina. Doutrina é simplesmente a apresentação das verdades de Deus trazidas das Escrituras numa forma que pode ser entendida e que se relaciona com as nossas vidas. Não diluíam suas mensagens com anedotas, humor, histórias triviais e levianas durante a pregação. Eram profundamente sérios, verdadeiros e austeros no púlpito, pois sabiam que ao chegar ali estariam lidando com verdades eternas e almas eternas. Sentiam a realidade solene do seu chamado divino. Pregavam a verdade de Deus como um homem que está morrendo para homens que estão morrendo.

Vejamos alguns exemplos:

1. Quando pregavam a doutrina do pecado tinham a coragem de chamar pecado de pecado mesmo. Eles pregavam o pecado como uma rebelião moral contra Deus, uma rebelião que traz um sentimento de culpa e, se não houver arrependimento e perdão, a conseqüência será a condenação eterna certamente. Pregavam a respeito de pecados específicos; pecados de omissão e pecados de comissão; pecados por palavras e ações; falavam do quanto foi horroroso o nosso pecado original em Adão e Eva; falavam à congregação que eles tinham um referencial muito ruim e um coração mal por natureza; que o homem natural não pode amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo; ensinavam de forma "aberta" que uma reforma, apenas externa na nossa vida, não é suficiente para salvação eterna; a reforma interna produzida pelo Espírito Santo é absolutamente necessária e por isso pregavam como aquela regeneração podia ser experimentada e então vivida.

2. Outro exemplo se vê na sua pregação. Pregavam de uma maneira muito forte a doutrina de Deus. A evangelização deles era construída em cima de forte base teísta; pregavam Deus no Seu ser majestoso e em todos os Seus atributos gloriosos. Não só deixavam Deus ser Deus, mas declaravam que Deus é Deus. Os puritanos colocavam Deus em uma posição bem elevada - como deve ser. Quando se aproximavam de Deus em oração não falavam com Ele como quem fala com o vizinho pela janela, ou como um vizinho que pode ajustar seus atributos de acordo com suas necessidades e desejos pessoais. O puritano sempre exaltou a majestade de Deus e, quando se aproximava de Deus, você podia perceber aquele sentimento profundo de reverência. O Deus que o puritano pregava era o Deus da Bíblia. Talvez um dos versículos mais importantes, na Bíblia, para um puritano, seria exatamente Gênesis 1:1 - "No princípio, Deus". E de Deus que emanam e se desdobram todas as coisas neste mundo. Todas as coisas são preparadas, iniciadas,projetadas e feitas para a glória de Deus!

3. A evangelização puritana também proclamava de forma completa e plena a doutrina de Jesus Cristo. Pregavam o Cristo integral para o homem integral. Recusavam-se em separar os benefícios que advêm de Cristo, da própria Pessoa de Cristo. Um dos grandes puritanos, Joseph Alleine, em seu clássico livro originalmente intitulado, An Alarm to the Unconverted (Publicado no Brasil pela PES, como Um Guia Seguro para o Céu), disse que o ser de Cristo integral é aceito por aquele que é realmente convertido. Os verdadeiros convertidos não aceitam apenas as recompensas de Cristo, mas a própria obra de Cristo. Não amam apenas os benefícios de Cristo, e sim também o "fardo" de Cristo ("...tomai sobre vós o meu jugo..."). Amam não só tomar os mandamentos, mas também, a cruz de Cristo. Por outro lado, o falso convertido recebe Cristo pela "metade". Ele quer os privilégios de Cristo, porém não quer se inclinar diante do senhorio de Cristo. Ele divide os ofícios de Cristo e os benefícios de Cristo. Esse é o problema dos "crentes" de hoje.

Freqüentemente Jesus tem sido apresentado na evangelização de hoje como alguém que está aí para satisfazer todas as necessidades e desejos dos homens. Na pregação de hoje, Jesus é apresentado como alguém que não exige que o homem ofereça o seu coração completo e a sua vida completa. Quando os puritanos pregavam, instavam com os pecadores a se voltarem para Jesus e avisavam que eles precisavam avaliar o preço de seguir a Jesus, e o preço era perder a sua vida; morrer diariamente por amor a Cristo, negar-se a si mesmo, tomar a cruz e segui-lO. Os puritanos tinham horror àquilo que hoje é chamada "a graça barata", porque, na verdade, essa não é uma graça verdadeira. Graça barata significa que eu aceito Jesus na minha própria força; Ele reforma um pouco a minha vida por fora, porém eu continuo agindo com os princípios egocêntricos no meu ser interior. A graça barata me leva a pensar que, por um lado, eu tenho a Jesus, que estou a caminho para o céu, mas, por outro lado me permite continuar vivendo uma vida mundana. Na verdade, eu estou mesmo no meu caminho para o inferno. Os puritanos apresentavam Jesus como um Salvador completo para um pecador completo. Um puritano disse: "O pregador que é o seu melhor amigo, é aquele que vai dizer mais verdades sobre você mesmo". Eles não estavam preocupados em causar dano ao amor próprio dos ouvintes das suas congregações. Eles estavam mais preocupados com Cristo do que com os ouvintes. Estavam preocupados com a Trindade. O cristão encontra o seu amor próprio a medida que ele ama ao Pai que o criou, ao Filho que o restaurou através da cruz, e no amor ao Espírito Santo que mora nele e que faz com que sua alma e seu corpo sejam templo do Espírito Santo.

4. A doutrina puritana expandia e explanava com detalhes a doutrina da santificação. A vida inteira do crente era para ser colocada aos pés de Deus. Ele tinha que trilhar a vereda do Rei no caminho da justiça. Ele precisava conhecer a vida de uma forma experimental. Precisava conhecer essas "irmãs siamesas" que são, a vida e a experiência. Quando o ministro prega sobre santificação, você precisa saber o que está sendo requerido de sua parte. Você não pode entender estas coisas sem doutrina e isso nos traz à terceira característica da pregação dos puritanos.

... Destacamos que a pregação puritana era experimentalmente prática. A ausência de uma pregação experimental e prática é uma das grandes falhas no culto e na evangelização de hoje. O que significa uma pregação experimental? A palavra experimental vem da palavra experiência. Em termos de cristianismo, a religião experimental significa que a Palavra de Deus e suas doutrinas precisam ser recebidas não apenas na mente (os puritanos chamavam isso de conhecimento na cabeça, apenas), mas também precisam ser experimentadas e vividas no coração. Isso eles chamavam de "conhecimento do coração". Eles baseavam este tipo de ensinamento, por exemplo, em Provérbios 4:23: "Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida".

Para os puritanos os pensamentos precisam fluir das Escrituras e as experiências do coração, fluem do ensino da doutrina e das Escrituras. Dessa forma, experiência não é alguma coisa mística, separada da Bíblia. Isso eles rejeitavam totalmente! Ao mesmo tempo, eles também rejeitavam completamente o tipo de religião que se satisfaz com o conhecimento apenas na cabeça, que é só racional. Estas doutrinas sobre as quais falamos resumidamente, a doutrina de Deus, de Cristo e do pecado, para os puritanos deviam ser tão reais quanto as cadeiras em que sentamos. Estas doutrinas precisam ser transformadas numa realidade que queime dentro de minha alma. Elas precisam influenciar toda a minha vida, todo o meu estilo de vida. Dessa forma, os puritanos acreditavam em viver, na prática, o que eles experimentavam. Sempre eles traziam suas experiências às Escrituras para terem a certeza de que estavam sendo totalmente bíblicos - até nas suas experiências. Para os puritanos doutrina seria algo vazio se não fosse acompanhada pela experiência. Toda experiência verdadeira leva a uma experiência pessoal com Cristo. Por isso é necessária a pregação da Pessoa de Cristo e esta pregação será honrada pelo Espírito Santo, porque Ele toma estas coisas e as aplica aos pecadores.

Os puritanos, na sua pregação, incluíam o que chamavam de "marcas de um auto exame". Estas marcas de exame eram os sinais que distinguiam a Igreja do mundo. Distinguiam os verdadeiros crentes daqueles que eram crentes nominais ou apenas por professarem a fé. Os puritanos faziam distinção entre fé salvadora e fé temporária. Muitos livros têm sido escritos a respeito deste assunto. O mais famoso deles foi escrito por Jonathan Edwards: Afeições Religiosas. Também o livro de João Bunyan, O Peregrino, contém tais marcas. O que nós hoje, desesperadamente precisamos, é de uma volta a este estilo de evangelização reformado-puritano que sempre está pesquisando e sondando o coração. Os puritanos nunca diziam de uma forma "leviana" que os pecados do povo estavam perdoados, mas pregavam de forma profunda o que realmente o pecado é e como ele tem afetado as pessoas. Eles procuravam tirar do pecador todo o seu sentimento de justiça própria para, então, levá-lo ao Senhor Jesus Cristo.

Alguém disse que a religião da América, hoje, tem 2.000 km de comprimento por 3.500 Km de largura (essas são as dimensões do país), mas com uma profundidade de mais ou menos 12 centímetros, apenas! O problema, em todos os lugares no mundo, hoje, é que a evangelização freqüentemente começa num lugar errado. Poderíamos dizer muitas coisas sobre as diferenças entre a evangelização moderna e a puritana, em relação à experiência do povo de Deus. Pois bem, quero apenas destacar um ponto e este é a resposta a uma pergunta: quando olhamos atrás para a história da Igreja, e também na história bíblica, observando as épocas de avivamento verdadeiro, não produzido pelo homem, qual era o elemento evidente naquela época que hoje está claramente ausente? Respondemos sem hesitação que é a ausência de profunda convicção de pecado. Este é um grande problema nos nossos dias.

Autor: Joel R. Beek. A Tocha dos Puritanos, Editora PES

Nenhum comentário:

Postar um comentário