quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Se Deus é o culpado, a culpa é nossa


Por Fernando Khoury

“A mulher que está dando à luz sente dores, porque chegou a sua hora; mas, quando o bebê nasce, ela esquece a angústia, por causa da alegria de ter vindo ao mundo. Assim acontece com vocês: agora é hora de tristeza para vocês, mas eu os verei outra vez, e vocês se alegrarão, e ninguém lhes tirará essa alegria. Naquele dia vocês não me perguntarão mais nada. [...] Eu lhes disse essas coisas para que em mim vocês tenham paz. Neste mundo vocês terão aflições; contudo, tenham ânimo! Eu venci o mundo”.

(João 16.21)

Todos nós temos a incrível tendência de procurar culpados para as grandes fatalidades da vida. A inocente criança vítima de abuso sexual. O trágico acidente que roubou a vida de um filho. A queda do avião com recém-casados indo para a lua de mel. O poder devastador do câncer que faz um coração cheio de sonhos parar de bater. A chuva torrencial que deixou 2 mil turistas ilhados sem água e sem comida em Machu Picchu. O terrível terremoto que matou mais de 200 mil pessoas no Haiti.

Diante de tais tragédias, não resta muito que fazer. Nessas horas, quando não encontramos argumentos racionais e explicações aceitáveis para a tragédia que nos assola, maior e mais inconsolável é a dor que o nosso coração é obrigado a suportar...e maior e mais ardente é a nossa inclinação para culpar a Deus.

Nos momentos de desesperança, os ateus gostam de se lembrar de Deus apenas para culpá-lo. Muitas das pessoas que eram simpáticas à existência de um Deus amoroso deixam de ser. E muitos daqueles que sempre acreditaram fielmente em um Deus protetor e cuidadoso se decepcionam vorazmente. Todos esses, de uma forma ou de outra, acabam incriminando a Deus em seus corações, vociferando em tom amargo:

Por que Deus permitiu que minha filhinha fosse abusada sexualmente? Por que Deus não fez nada para evitar que o avião caísse? Por que Deus permitiu que uma pessoa tão jovem fosse consumida por um câncer? Por que Deus se omite ao ver a natureza que Ele criou se rebelando contra a humanidade?

Não há nada mais natural do que essa reação. Quando acontece uma tragédia que nós, em nossa limitação, não entendemos ou não conseguimos compreender o porquê, é normal que coloquemos a responsabilidade sobre algo ou alguém que também não entendemos ou compreendemos plenamente. Quando o incognoscível nos faz sofrer, colocar a culpa no desconhecido parece ter o poder inexplicável de nos confortar.

Mas não conforta. Antes, nos aprisiona a uma dor que nunca vai cicatrizar totalmente; torna-nos escravos de uma pergunta que nunca vai ter resposta. Do lado da acusação, estamos nós, os seres-humanos. E Deus, no banco dos réus, acaba se tornando cada vez mais o grande culpado, justamente porque Ele ainda não é conhecido por grande parte de seus acusadores.

Se a humanidade conhecesse mais o Deus que a criou, certamente pararia para pensar no seguinte: e se Deus simplesmente não for o responsável por tudo isso? E se a culpa for do homem, da máquina, do clima? E se não existir necessariamente um culpado?

Se nós conhecêssemos mais a Deus, fatalmente entenderíamos que Ele nos ama, mesmo que as circunstâncias O acusem dizendo que Ele não nos ama. Compreenderíamos que o amor de Deus se aperfeiçoa, muitas vezes, no abandono. Perceberíamos que Deus é soberano, mas o homem é responsável. Enfim, saberíamos que Ele continua com seus olhos sempre abertos cuidando de nós, mesmo que nossos olhos O acusem da mais terrível omissão.

O grande erro da humanidade está em pensar que, se Deus existe, nenhum mal pode acontecer. Porém, Deus não depende de acontecimentos extraordinários ou de milagres para provar sua existência e demonstrar seu amor. Deus está na maior de todas as curas, e também está na maior de todas as perdas. Deus não precisa de circunstâncias favoráveis para mostrar que está ao nosso lado, cuidando de nós. Para demonstrar seu amor por nós, Deus não precisa de mais nada além do que já fez: dar a vida do seu único filho numa cruz.

A verdade é que todos esses desastres apontam para uma única resposta: a fragilidade do ser-humano. Sim, somos vulneráveis, fracos e pequenos demais. Hoje podemos estar cheios de vigor e esbanjando saúde, e amanhã amanhecermos num leito de hospital com insuficiência respiratória, à beira da morte. Deus não nos criou para sentir dor, mas sentimos. Deus não nos criou para morrer, mas morremos. O que aconteceu? O que está errado?

C.S. Lewis (teólogo) disse que "todo homem sabe que algo está errado quando sente dor". Portanto, a dor que sentimos não nos mostra que Deus não existe ou não ama o ser-humano. Antes, nos mostra que algo está errado; nos mostra que a vida que vivemos hoje não é a vida que Deus criou para vivermos. Mostra-nos que o mundo como o conhecemos não é o mundo como Deus o concebeu. De fato, toda a dor, todas as mortes e todo o sofrimento que nos assolam não estavam de acordo com o plano inicial de Deus, mas são frutos do nosso afastamento de Deus desde o início da criação.

Então, para buscar resgatar o homem ao seu plano inicial, Deus preferiu condenar um inocente para salvar os verdadeiros culpados. A morte de um inocente trouxe vida a todos os culpados. Jesus veio ao mundo para dar vida eterna a todos aqueles que creiam no Seu nome e vivam como Ele viveu. Isso é promessa de Deus: "EU SOU A RESSURREIÇÃO E A VIDA. QUEM CRÊ EM MIM, AINDA QUE MORRA, VIVERÁ” (João 11.25). EU ENXUGAREI DE SEUS OLHOS TODA LÁGRIMA; E NÃO HAVERÁ MAIS MORTE, NEM HAVERÁ MAIS PRANTO, NEM LAMENTO, NEM DOR." (Apocalipse 21:4)

Se continuarmos olhando para todas essas tragédias através de uma visão estritamente humana e sem conhecer o verdadeiro caráter de Deus, acabaremos empurrando nossas almas do alto de um abismo, cada vez mais para longe dEle. E, assim, a cada dia nos tornaremos um pouco mais frágeis, vulneráveis, perdidos e sem esperança. Está na hora de, antes de acusarmos a Deus, olharmos para a trave que está no nosso próprio olho. Está na hora de conhecermos a Deus como Ele verdadeiramente é. Porque se Deus é o culpado, a culpa é nossa.

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