terça-feira, 27 de julho de 2010

Graça no sofrimento


Por John MacArthur

Se examinarmos a vida de Estêvão do ponto de vista do seu lugar estratégico no plano de Deus, verificaremos que sua importância não foi menor que a de Moisés. Estêvão desempenhou um papel decisivo durante um importante período de transição para a Igreja na terra. Foi sua morte que levou os crentes em Jerusalém a se espalharem como testemunhas para as outras partes do mundo (At 8.1). Mas o ministério de Estêvão em Atos 6-7, anterior ao seu martírio, também foi crucial. Devido ao fato de haver pregado aos judeus de fala grega em Jerusalém, tornou-se ele a ponte de ligação da Igreja Primitiva - de Pedro, o apóstolo dos judeus, a Paulo, o apóstolo dos gentios. Estêvão, na verdade, foi o elo de transição entre a evangelização de Jerusalém e a evangelização do mundo.

Estêvão não foi apenas um poderoso evangelista - foi também um dos mais eloqüentes defensores da fé cristã que já serviu a Igreja em todos os tempos. É assim que Lucas descreve o ministério de Estêvão:E Estêvão, cheio de fé e de poder, fazia prodígios e grandes sinais entre o povo. E levantaram-se alguns que eram da sinagoga chamada dos libertinos, e dos cireneus e dos alexandrinos; e dos que eram da Cilicia e da Asia, e disputavam com Estêvão. E não podiam resistir à sabedoria, e ao espírito com que falava (At 6.8-10).

Aqueles judeus de fala grega estavam transtornados com Estêvão, porque de forma tão convincente e inflexível, ele apresentava a Jesus e a Nova Aliança como o substituto do sistema religioso da Antiga Aliança dos judeus. A oposição dos judeus rapidamente atingiu o nível da fúria cega, que somente poderia ser satisfeita com sangue - o sangue de Estêvão como o primeiro crente a morrer martirizado (At 7.57-60).

O relativamente curto ministério de Estêvão é, por si só, uma inspiração para os crentes dos dias de hoje. Todavia, sua excelência como exemplo é demonstrada principalmente através de sua morte. Muito podemos aprender de seu caráter ao examinarmos a maneira como ele reagiu quando confrontado pela perseguição e morte violenta. Altruísta e corajosamente Estêvão fez a coisa certa, proclamando a verdade, a despeito das conseqüências.

Graça no sofrimento

Ao descrever a escolha dos primeiros diáconos, Atos 6.5 qualifica Estêvão como "homem cheio de fé e do Espírito Santo". Implícito no termo "fé" está a idéia de graça ou favor de Deus. De fato, Atos 6.8 desenvolve mais esta frase, e diz que Estêvão estava "cheio de graça e de poder".3 Os que têm fé e o Espírito Santo - ou seja, todos os crentes - também contam com uma completa medida de graça e poder. Estêvão certamente estava cheio de toda a graça necessária para enfrentar qualquer tipo de situação (vide 2 Co 12.9; Tg 4.6; 1 Pe 2.20; 3.14; 4.14).

O tipo de graça de que estamos falando é a da bondade amorosa dirigida às pessoas. E, Estêvão, pela fé, definitivamente a possuía. Esta pode ser parte da razão de a igreja em Jerusalém tê-lo escolhido como um dos primeiros diáconos, com a responsabilidade inicial de ajudar as desprezadas viúvas no ministério quotidiano.

Estêvão demonstrou ter esta graça em relação às outras pessoas duma forma muitíssimo clara justamente no momento da morte. Em Atos 7.60, enquanto os judeus atiravam-lhes pedras, ele ajoelhou-se, olhou para o céu, e exclamou: "Senhor, não lhes imputes este pecado". Tal benevolência somente pode vir da parte do Senhor. Como poderia um ser humano proferir tais palavras àqueles que lhe estavam tirando a vida? Este tipo de reação, cheio de confiança e de graça, era o resultado de sua fé no sentido de que Deus estava, soberanamente, no controle de sua vida e morte. E por isso que Estêvão não se preocupou em se proteger. Ele morreu alegre e pacificamente na vontade de Deus. Tudo o que fez foi confiar no plano global de Deus para sua vida, sem lutar para se salvar (compare Gn 50.20; Jr 29.11).

Tranqüilidade no sofrimento

Próximo do início de sua perseguição fatal nas mãos dos judeus incrédulos, Estêvão demonstrou outra evidência clara e extraordinária de que o episódio não era corriqueiro. Atos 6.15 diz: "Então todos os que estavam assentados no conselho, fixando os olhos nele, viram o seu rosto como o rosto de um anjo". Sua expressão facial deve ter se constituído numa das mais incompreensíveis e maravilhosas repreensões jamais vista numa intimidação e perseguição tão perversas. Certamente os oponentes de Estêvão ficaram atônitos e confundidos diante de uma reação tão atípica. A mera reação, que muitos crentes poderiam haver demonstrado numa situação como esta, incluiria com certeza ansiedade, estresse e talvez raiva.

A extraordinária e piedosa reação de Estêvão a essa injustiça ("e, investindo com ele, o arrebataram", At 6.12) e as distorcidas e falsas acusações armadas contra ele (At 6.11), oferecem-nos o melhor exemplo de como devemos portar-nos em meio a mais difícil das circunstâncias. A expressão de serenidade e tranqüilidade na face de Estêvão dá-nos mais uma prova de que ele estava cheio do Espírito Santo, e tinha um íntimo relacionamento com Deus.

Não sabemos exatamente qual seria a aparência do rosto de Estêvão, mas creio que manifestava uma tranqüilidade e um gozo sobrenaturais, por encontrar-se ele impregnado da glória e da presença divinas. O apóstolo Pedro afiançou: "Se pelo nome de Cristo sois vituperados, bem-aventurados sois, porque sobre vós repousa o Espírito da glória de Deus" (1 Pe 4.14). Do rosto de Estêvão irradiava a glória divina, constituindo-se esta numa incrível reprimenda àqueles incrédulos que reivindicavam conhecer a Deus.

Outro homem que teve o rosto irradiado pela glória de Deus foi Moisés (Êx 33.7-11,17-23; 34.29-35). Para os inimigos de Estêvão, a ironia disso tudo era que assim como falsamente o haviam acusado de blasfemar contra Moisés, Deus imediatamente passou a refletir sua glória no rosto de Estêvão (At 6.11-15). Isto efetivamente colocou-o em termos de igualdade com Moisés (já fizemos alusão a isso neste capítulo) e revelou que Deus aprovava Estêvão como mensageiro da Nova Aliança. No tempo certo, Deus aprovara Moisés como o representante da Antiga Aliança, mas agora era a vez de Estêvão ser o representante de Cristo (vide 2 Co 3.7-11).

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