domingo, 12 de setembro de 2010

Pastor desviado deve sair do armário?


Por Zé Luís



A tradução da palavra “meditar” em espanhol é “ruminar”, ato bovino de regurgitar o alimento já engolido, tornando a masca-lo, intencionando extrair dele mais do que na primeira mastigação. Em termos de reflexão pessoal, isso é um exercício muito útil.

Recebi recentemente, através de um comentário anônimo, a seguinte pergunta:

“Pastor desviado deve sair do armário?”

Você- assim como eu - deve estar se questionando sobre qual o real significado da pergunta. Como não consigo imaginar quais dos meus oito leitores poderia te-la feito (e anonimamente, coisa que não fazem) – e que na verdade nem é o verdadeiro interesse da questão – tentei não ter tanta pressa para opinar sobre tão delicado questionamento entre nós, cristãos confusos. Além do mais, a questão pode ter diversas respostas implicadas.

“Sair do armário” é o termo usado quando um homossexual resolve assumir suas preferências sexuais diante de seu meio social, incluído gente que provavelmente se entristecerá com a noticia. Ainda hoje, por mais que a militância gay trabalhe para que essa opção seja irrestritamente aceita, ainda não se consegue conter a frustração de muitos familiares que sabem o quanto tal decisão fará sofrer aquele que a assumiu, assim como este, parece não faze-la por opção.

Este “pastor”, citado na pergunta, estaria desviado por ser gay? Não creio que seja isso. No mundo cristão evangélico, um homem pode ser aceito como tal, desde que não pratique o ato. Isso o isentaria de dizerem que ele é, embora haverão sempre comentários maldosos sobre os possíveis trejeitos efeminados do sujeito. É um mundo hipócrita, muitas vezes.

Desisti de me ater ao “sair do armário”e me foquei então em “desviado” e “pastor”.

No que consiste ser um desviado? Em uma igreja mais tradicional, se for uma mulher usando calças, ou por cortar pontas de cabelo, certamente estarei incluso no grupo.

Dependendo do ambiente religioso cristão em que fui “doutrinado”, posso estar fora da risca limitadora que me mantém salvo se por acaso não respeitar o sábado, se comer carne suína, se não der o dízimo, se não for em todos os cultos, se falar em línguas, se não falar em línguas, se não me ater ao livro de regras denominacionais locais ou mesmo questionar as preferências políticas impostas, com alegações estapafúrdias relacionadas a crenças bíblicas...

Dentro destes poucos parâmetros apresentados (em um universo muito mais vastos de indagações possíveis, já que a criatividade e a imbecilidade humana é infinita), creio que não sobrarão muitos pastores, presbíteros, ministros, levitas, anciãos, anjos, querubins, serafins, que não estejam de alguma forma desviados. Mesmo porque, em um denominação sou salvo e benção, e atravessando a rua, em outra, sou o diabo em pessoa.

Conheço gente que acredita que a sua igreja – comprovadamente equivocada em suas doutrinas – errou em condená-lo a “não-salvação”, mas por mais que se tente incorporá-lo em uma que detém a sã doutrina, este prefere a antiga, mesmo doentia, sabendo que jamais alcançará tamanha exigência de santidade. Ele escolhe continuar no tradicional erro.

Como, sendo pastor (ou no caso das igrejas que aceitam, outro desvio a ser apontado) ou pastora, gente que galgou tantos degraus, abandonar toda essa doutrina assimilada – não com pouco afinco - para transmitir, e revelar-se contrário a ela? Se fosse apenas uma simples ovelha de banco, mas um pastor(a)?

Como não pensar em Abraão e seu filho, para tentar acalmar a alma, quando esta prestes a cumprir a Ordem, em nome da Verdade, abrir mão de seu Isaque, seu bem maior e mais querido.

“Aguarde aqui e voltaremos...” disse Abraão quando subiu ao monte com o filho para o sacrifício. Ele sabia que voltaria com seu maior afeto, apesar de caminhar para a morte certa dele, por ordem de quem lhe dara tudo. Abraão não se apegou às conquistas, sabia que não havia situações irreversíveis Naquele que o chamou no início de sua jornada.

Não havia medo nem insegurança. Por isso ele era ímpar para Deus.

Nós nos apegamos a essa coisa requintada que a palavra “ministério” nos dá, embora o Espírito, suavemente aponte, que ainda não estamos no trilho que Ele projetou.

Um pastor que vai “sair do armário” deve saber o que um gay enfrenta: o mundo – ou mundinho? - ruirá sobre sua cabeça, e muita solidão será sua principal companheira. Aquele meio social que – supostamente – o amava, o tratará no máximo, com o carinho que damos aos amados com doenças infecto-contagiosas.

Um gay sabe disso, um desviado sabe disso, que decide pela Verdade saberá disso.

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