quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Igrejas Cheias... Relacionamentos Vazios


Por Cleusa de S. Klein

Eu já participei de igreja cujo rol de membros ultrapassava os dois mil. Em outras tão pequenas que não chegava a trinta, onde a maioria pertencia à mesma família. Grande diferença. Cada irmão é conhecido e chamado pelo nome. E o abraço então, aconchegante, amistoso e caloroso. Enquanto isso nas igrejas agigantadas, equipes trabalham por turno e a maioria dos membros mal se conhece. O contato é superficial, pessoas viram números e o velho e essencial acolhimento que começaria “dentro de casa” acaba se perdendo em meio a outras novidades. A preocupação é atender e impressionar bem aos que vem de fora. Enquanto isso, no interior dos grupos, quanta gente sofrendo de solidão... Minguando afetivamente!

Tenho grande preocupação em avaliar como tem sido a nossa relação com demais pessoas de dentro da família de Cristo, no cotidiano e no institucional. Conseguimos perceber o olhar mais triste nesse ou naquele dia? Quando estes (as) desaparecem por algum tempo, o nosso primeiro pensamento é de censura ou preocupação? Passa pela nossa cabeça que possam estar atravessando uma fase difícil e, em caso afirmativo, nos mobilizamos para ampará-los? Aos que retornam após um período de ausência, a manifestação tem sido de acolhimento e alegria ou de cobrança?

Ah, as tais cobranças... Das piadinhas sarcásticas e olhares enviesados ao dedo em riste, vale tudo para manter o “bom andamento das atividades, em nome de Jesus”... Porém, vale a pena pensar se tem sido oferecido afeto, compreensão e solidariedade de acordo o que se cobra.

Muitas denominações se deixam favorecer por regras e dogmas que inibem a espontaneidade e a afetividade entre os trabalhadores da Seara de Cristo. Diversos grupos acabam resvalando para o extremismo. Antes, durante e depois das reuniões ignora-se que onde não há espaço para diálogo e autenticidade não pode haver uma relação saudável e verdadeira. Assim, vestindo a armadura do formalismo que afasta - em lugar da naturalidade que aproxima - temos nos tornado indiferentes. Sem perceber que estamos uns com os outros e não apenas passando uns pelos outros.

A preocupação em ser impecável sobrepõe-se então ao importar-se com. É que andamos muito ocupados em ser perfeitos. Ser perfeito como nosso Pai que está nos céus está longe da pretensa santidade que ainda estamos longe de possuir... Quanta ilusão! Louvo a Deus pela sua indizível graça e misericórdia por nós pecadores, adotados por ele, salvos por Jesus, nosso grande mediador.

Acontece de um irmão procurar ajuda, lá vem o julgamento implacável implícito na “velha e decorada receitinha”: Oração e vigilância... Com direito, é claro, a sorrisinho paternalista e tapinha nas costas. Dali cada qual pro seu lado e a cômoda sensação de dever cumprido, sem que tenhamos, entretanto, caminhado um milímetro sequer em direção às reais necessidades do outro. Sem contar que, numa quase ditadura como critério de “promoção” a trabalhador cristão, raros são os que têm coragem de expor suas dificuldades, por mais que estejam passando o pão que o diabo amassou. Afinal, um cristão não pode estar sujeito aos problemas existenciais inerentes aos “mortais”, como stress, depressão, frustração amorosa ou qualquer outro tipo de sentimentos. Daí o receio de se abrir, pois mostrar alguma fragilidade pode significar perda de credibilidade nas bênçãos de Deus, estar em pecado e até mesmo falta de conversão. Outras vezes pode render o estigma indigesto de endemoninhado.

Some-se a tudo isso o fato que, embora se dizendo crentes em Jesus, a maioria das igrejas tem vivido na prática como bons materialistas. Interagindo numa sociedade altamente competitiva, tem sido sutilmente seduzidos pelo supérfluo, em detrimento do essencial. As palavras de Jesus nos induz a buscar primeiro o reino de Deus e a sua justiça, objetivo primordial da vida do cristão. O sucesso profissional, social e financeiro, que inclui produzir, consumir (desde títulos acadêmicos e profissionais a bens materiais) nos seriam acrescentados. Mas ser “bem sucedido” dá muito trabalho. Os inúmeros cursos, viagens e horas extras à noite, fins de semana e feriados, somados à necessidade exacerbada de ter, tomam-nos muito tempo. Então os compromissos com o reino deixam de ser prioridade. Vão sendo adiados ou passados para terceiros pela metade, encaixados nas sobras de tempo que restam de tudo o que é material e “urgente.” Passa-se a ser membro do corpo quando dá... Só pra bater o ponto... E de preferência sem hora marcada. Nem bem acabou o “amém” as pessoas já saem apressadas para “levar ou buscar Fulana e Beltrano não sei onde”... Ou para compromissos que poderiam tranquilamente ser agendados em outra data.

Sabemos que quanto mais superficial a convivência, mais frieza nas relações. Passamos então a nos esbarrar não como irmãos, mas como meros colegas, como num circulo de relações à parte, onde dificilmente há lugar para os companheiros de ideal.

Dentro do preciosismo doutrinário e do igrejismo teremos perdido a sensibilidade, o prazer de estarmos juntos, os laços de amizade que extrapolavam os muros da igreja? Em que lugar do tempo foi parar as gostosas confraternizações, os agradáveis bate-papos após as atividades... A amizade parceira e edificante, o olhar atento que detectava quando esse ou aquele amigo não estava bem. Onde foi que perdemos o interesse verdadeiro pelo bem-estar uns dos outros?... Talvez seja mais fácil culpar alguém. Isso faz parte de nossa síndrome Adâmica. Precisamos responder honestamente a essas perguntas, mas uma coisa é inegável: Coragem é questão de fé, e tempo é questão de organização e prioridade.

Trazemos as pessoas para nossa congregação e por fim as deixamos abandonadas nos bancos de nossas igrejas. E são tantos os irmãos que reclamam atenção especial... Amigos e companheiros solitários para os quais os fins de semana são intermináveis e que, se acolhidos, com certeza se sentiriam muito melhor!... Companheiros em processos de reabilitação, a recomeçar em difíceis períodos de crise existencial, para os quais faria toda a diferença uma conversa amorosa, a presença amiga naquele momento ou a visita surpresa de aniversário. Celebrar gente é trabalhar a autoestima individual e coletiva. Quando as pessoas se sentem valorizadas, quando são envolvidas em ambiente de carinho, alegria e leveza, todo o grupo se torna mais harmônico, feliz e produtivo.

Eu me pergunto: Os tempos mudaram tanto assim... Ou as pessoas fizeram questão de mudar? “Amai-vos uns aos outros como a ti mesmo” A construção da frase sinaliza, clara e pedagogicamente, para a ação prioritária. Já temos teoria de sobra. Precisamos urgentemente aplicá-la no cotidiano das relações. É avaliar com honestidade até que ponto ser impecável, indispensável e PHD, tem sido mais importante do que ser irmão.

Repensemos. Continuar a brincar de ser cristão alimentando a distância entre o discurso e a pratica, é um enorme desserviço ao nosso próprio crescimento e felicidade. A Bíblia tem nos alertado sobre atos farisaicos... Para nossa sorte, em casos de pobreza e vulnerabilidade espiritual a Misericórdia Divina nunca nega o perdão e o abrigo quando é suplicado.

Em João 15: 14 lemos que: “Sereis meus amigos se fizerdes o que eu vos mando”. Neste momento é imperioso resgatar a nossa identidade de seguidores sinceros de Jesus, buscando interagir com sinceridade e companheirismo. Como distribuir aos que chegam o afeto, o aconchego e a tolerância quando não conseguimos construir entre nós, irmãos em Cristo Jesus?

No Amor de Cristo

Cleusa de S. Klein

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