domingo, 22 de outubro de 2017

AS BEM-AVENTURANÇAS - PARTE 3


Por Pr. Silas Figueira

7 - BEM-AVENTURADOS OS PACIFICADORES (Mt 5.9).

Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.

Na Bíblia, existem quatrocentas referências à paz. Deus se autodomina o “Deus da paz”, mas não há paz no mundo. E existem duas razões: a oposição de Satanás e a desobediência do homem. A queda de alguns anjos e a queda do homem resultaram em um mundo sem paz [1]. D. Martyn Lloyd-Jones pergunta por que há tantas guerras no mundo? Por que se mantém essa constante tensão internacional? O que há com este mundo? Por que já tivemos duas guerras mundiais só no século XX? E por que essa ameaça perene de novas guerras, além de toda essa infelicidade, turbulência e discórdia entre os homens? De conformidade com essa bem-aventurança, só existe uma resposta para essa indagação – o pecado. Nada mais, é somente o pecado [2]. Por isso que desde a queda até o fim dos tempos o mundo tem enfrentado a falta de paz. 
  
Os pacificadores do mundo têm um terrível registro. A paz que saudamos hoje começa a desmoronar amanhã. Não temos paz política, econômica, social ou familiar. Não temos paz em lugar algum porque não temos paz em nosso coração. Este é o verdadeiro problema. Alguém já disse: “Washington tem inúmeros monumentos à paz. Depois de cada guerra, constroem um” [3]. 

O problema não é externo, mas interno. O problema reside dentro do coração do homem, e somente através da transformação desse coração é que o homem poderá ser um pacificador dentro dos princípios bíblicos. E quais seriam esses princípios? Para essa resposta devemos entender o que vem a ser o pacificador que Jesus fala aqui e essa paz que ele almeja estabelecer.

1º - O que não é paz segundo a Bíblia. Antes de definirmos o que vem a ser esta paz que o pacificador deseja estabelecer, devemos entender o que não é esta paz de acordo com a Palavra de Deus.

1) Não é ausência de conflitos. Por exemplo, quando um judeu diz a outro judeu: “Shalom”, não está querendo dizer: “Que você não tenha guerra”. Ele está querendo dizer: “Que você tenha a justiça e bondade que Deus pode dar” [4]. Que em meio a “guerra” do dia a dia a paz (shalom) de Deus o alcance e esteja em paz para enfrenta-la.

2) Não é fuga do confronto. Não é fugindo dos problemas que teremos paz. Muitas vezes a paz só virá quando enfrentarmos a adversidade de frente. É encarar o problema para tentar resolvê-lo. Sem confronto mantem-se a distância, mas isso não gera paz nos relacionamentos.

3) Não é sacrificar a verdade. Muitos hoje querem a paz e a união de todos, mas enterrando a verdade. Nesse sentido, Jesus veio trazer não a paz, mas a espada (Mt 10.34). Não há unidade fora da verdade. A paz com todos e a santificação precisam andar juntas (Hb 12.14). Por isso que o ecumenismo é uma falácia [5]. Para que haja a verdadeira paz o homem tem que ter um encontro com o Senhor, mas se eu me recuso a pregar a verdade que liberta para evitar conflitos com outras pessoas de outras religiões, então eu estou vivendo uma falsa paz. Eu não posso estar em paz vendo a pessoa indo para o inferno calado diante do caminho errado que estes estão trilhando.

Jesus deixou isso bem claro quando disse: “Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim” (João 14:6), aí eu vejo a pessoa percorrendo por outro caminho, mas em nome da “paz” eu não lhe aviso que ele está errado para evitar confronto? Isso não é buscar a paz, isso é covardia.

4) Não é paz a qualquer preço. Paz e apaziguamento não são sinônimos; e a paz de Deus não é paz a qualquer preço. A paz que o Senhor nos oferece custou o sangue do Senhor Jesus na cruz. Proclamar “paz, paz”, onde não há paz, é obra do falso profeta, não da testemunha cristã (Jr 8.11) [6].

2º - Os pacificadores são os que estão em paz com Deus. A primeira característica de um pacificador, segundo a Bíblia, é que está em paz com o Senhor. É impossível alguém dizer que se enquadra dentro desta bem-aventurança longe de Deus e de Seus princípios.

Como disse Paulo em Romanos 5.1,2:

“Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo; por intermédio de quem obtivemos igualmente acesso, pela fé, a esta graça na qual estamos firmes; e gloriamo-nos na esperança da glória de Deus”.

Vejamos também 2 Coríntios 5.17-18:

“Pelo que, se alguém está em Cristo, nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo. Mas todas as coisas provêm de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por Cristo, e nos confiou o ministério da reconciliação”.

Reconciliar é mudar; é a união de duas ou mais partes pela renovação de bases ou causas de desarmonia. A reconciliação é necessária para pôr um fim à inimizade existente e está relacionada com a restauração da comunhão entre o homem pecador e Deus, através de Jesus Cristo. Por causa do pecado, o homem é declarado inimigo de Deus (Rm 5.8). Porém, Jesus que não conheceu pecado, Deus o fez pecado por nós. Ele levou sobre si os nossos pecados; levamos sobre nós agora a sua justiça! Que maravilha! (Is 59.1-2; Ef 2.14-18). Deus fez tudo novo quando justificou (salvou, perdoou) o pecador. Deus não justificou o pecado, mas o pecador.

O pacificador é mais que uma pessoa que evita os conflitos ou que tenta termina-lo. O pacificador é alguém que luta para que a paz de Deus seja estabelecida entre as pessoas. O pacificador provoca conflitos, pois leva o homem a refletir sobre seu estado espiritual, mas faz isso a fim de estabelecer a paz do pecador com o Senhor.

Por ele ter alcançado a paz com Deus, ele agora luta para que muitas outras pessoas a alcancem também. O pacificador luta para que a glória de Deus seja estabelecida entre os homens.

3º - A recompensa por sermos pacificadores. O Senhor Jesus disse que os que são pacificadores serão recompensados. Eles serão chamados filhos de Deus. O diabo veio para matar, roubar e destruir, no entanto, nós, como filhos de Deus, temos que manifestar ao mundo vida, doação e restauração vindas da parte de Deus.

Agindo dessa forma manifestaremos ao mundo que somo filhos de Deus. Esse é o maior título que alguém pode querer ter nesta vida e na vindoura. A língua grega utiliza huios para filhos e não tekna que significa criança. Aqui o texto fala de filhos adultos, como Cristo que iniciou seu ministério na idade adulta, assim nós, como filhos, revestidos da plenitude de Cristo, manifestamos ao mundo a sua paz na condição de filhos Deus. Em outra, filhos responsáveis.

Esse é um título honroso que carregamos conosco.

O diploma de doutor honoris causa concedido a personalidades que se destacaram em determinadas áreas do conhecimento, não tem relação com a vida acadêmica de quem o recebe. Não tem valor profissional nem vale como certificado de produtividade científica. Ainda assim, é um dos mais importantes títulos que uma pessoa pode receber, já que se o ganha é porque atingiu um patamar de amplo reconhecimento profissional e de feitos significativos. Fernando Henrique Cardoso recebeu a honraria pela Universidade de Harvard, e o cirurgião Ivo Pitanguy pela Universidade de Tel Aviv, em Israel. Em todos os casos, um conselho formado por professores de cada área se reúne para decidir a quem é merecido dar o prêmio. E em nenhum deles a titulação tem valor comercial. Ou seja, não se compra. Algumas entidades, porém, aproveitando que não é preciso o aval do Ministério da Educação (MEC) para conceder o diploma, têm vendido a honraria a diretores e pesquisadores brasileiros, que pagam até R$ 3.600 para se tornarem “doutores”. “É contraditório, pois é um título dado para honrar o professor. E a honra não se compra”, afirma Renato Janine Ribeiro, ex-ministro da Educação.

A honra de sermos chamados filhos de Deus, por sermos pacificadores também não se compra, no entanto há muitas pessoas que dizem ser filhos de Deus, mas que, em nada, são pacificadores. E se não são pacificadores não são filhos de Deus.

8 – BEM-AVENTURADOS OS PERSEGUIDOS (Mt 5.10-12).

“Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus. Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos injuriarem, e vos perseguirem, e, mentindo, disserem todo mal contra vós. Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes de vós”.

Chegamos a última bem-aventurança, e ela termina de uma forma de alerta aos que fazem parte do reino dos céus. Pode parecer estranho que Jesus passasse dos pacificadores para a perseguição, da obra de reconciliação à experiência de hostilidade. Mas, por mais que nos esforcemos em fazer a paz com determinadas pessoas, elas se recusam a viver em paz conosco. Tudo isso, por causa da justiça [7]. Como disse Paulo a Timóteo:

“Ora, todos quantos querem viver piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos” (2Tm 3.12).

Para nós, é quase incompreensível associar perseguição com felicidade. Perseguição e felicidade parecem-nos coisas mutuamente exclusivas. Este é o grande paradoxo do cristianismo. Jesus, no entanto, termina as bem-aventuranças, dizendo-nos que o mais elevado grau de felicidade está ligado à perseguição. Obviamente, não são felizes todos os perseguidos, mas os perseguidos por causa da justiça [8]. Veja o que Pedro nos fala sobre isso:

“Amados, não estranheis o fogo ardente que surge no meio de vós, destinado a provar-vos, como se alguma coisa extraordinária vos estivesse acontecendo; pelo contrário, alegrai-vos na medida em que sois coparticipantes dos sofrimentos de Cristo, para que também, na revelação de sua glória, vos alegreis exultando. Se, pelo nome de Cristo, sois injuriados, bem-aventurados sois, porque sobre vós repousa o Espírito da glória e de Deus. Não sofra, porém, nenhum de vós como assassino, ou ladrão, ou malfeitor, ou como quem se intromete em negócios de outrem mas, se sofrer como cristão, não se envergonhe disso; antes, glorifique a Deus com esse nome” (1Pe 4.12-16).

Observe que a promessa vinculada a essa bem-aventurança é a mesma promessa ligada à primeira das bem-aventuranças, “porque deles é o reino dos céus”. Então isso serve de prova adicional do fato que esta é a derradeira bem-aventurança. Começamos pelo reino dos céus e também terminamos pelo reino dos céus. Naturalmente, não é que as várias bênçãos vinculadas às outras bem-aventuranças também não pertençam àqueles que são herdeiros do reino dos céus, ou que os tais não receberão essas várias bênçãos. Todos os herdeiros da pátria celeste serão abençoados; mas nosso Senhor começou e terminou a sua descrição com essa promessa particular, com o intuito de impressionar os Seus ouvintes de que o fator mais importante é o indivíduo ser membro do reino dos céus [9].

Ninguém quer sofrer perseguição, isso é um fato. Mas se queremos ser crentes fiéis, nós seremos perseguidos (At 14.22). Eu estou falando de fidelidade à Palavra, de crentes compromissado com o Reino dos Céus. De gente com vida no altar. Não crente “meia boca” como temos visto por aí. Principalmente certos líderes que dizem que estão sendo perseguidos por causa do “reino”, só se for por causa do reino das trevas. Líderes fraudulentos que estão compromissados somente com seus umbigos. Enganando os incautos com suas falsas promessas de riqueza e saúde para os fiéis que contribuem para o “seu reino”.

A causa da perseguição:

1º - Somos perseguidos porque vivemos em um mundo hostil a Deus. Nós nos daremos muito bem se ninguém descobrir que somos cristãos, mas à medida que começamos a viver a vida de Cristo, à medida que começamos a manifestar as bem-aventuranças, à medida que compartilharmos as injúrias de Jesus Cristo, à medida que comungarmos nos seus sofrimentos e à medida que vivermos retamente no mundo, descobriremos que os filhos da carne sempre perseguirão os nascidos do espírito [10].

Por isso que as bem-aventuranças são uma contracultura cristã. Vivemos em um mundo onde os humildes não tem vez nem voz, pois o que prevalece é o orgulhoso; pessoas que vivem para satisfazer sempre o seu ego. O mundo não chora pelos seus pecados, ao contrário, faz de conta que o pecado é algo natural; o antinatural é um viver santo. Observe que quando um casal diz que irá se guardar para o casamento vira manchete de jornal. Viraliza tal notícia na internet. O mundo não tolera os mansos e nem sabe o que é misericórdia. Essas coisas são contrárias ao sistema. O mundo é nosso inimigo e não podemos ser amigos do mundo (Tg 4.4; 1Jo 2.15). Por isso a perseguição. E sinto lhe informar, mas a perseguição não vem somente do mundo hostil a Deus, mas, infelizmente, vem também de pessoas que se dizem ser cristãs. De gente de dentro da igreja. O cristianismo formal geralmente é o pior adversário da pura fé cristã [11].

2º - Somos perseguidos por causa da justiça (Mt 5.10). Como falamos, a perseguição é simplesmente o conflito entre dois sistemas de valores irreconciliáveis, em outras palavras, os crentes são perseguidos porque são diferentes de outras pessoas.

Aqueles que são perseguidos sofrem simplesmente por sustentarem os padrões divinos de verdade, justiça e pureza, recusando-se a ajustar-se ao paganismo ou a curvar-se perante ídolos que os homens erguem como substitutos de Deus [12]. Mas podemos passar pela vida sem sofrer perseguições. Primeiro, aprove os padrões do mundo. Enquadre-se. Aceite a ética e conduta do mundo. Viva como vive o mundo. Ria das suas piadas, divirta-se com as suas brincadeiras, sorria quando o mundo ridiculariza Deus. Deixe que o mundo use o nome de Deus em vão. Não diga que estão perdidas sem Jesus Cristo. Não diga que estão condenadas à morte e, seja o que for que você faça, não mencione a palavra inferno. Eu lhe asseguro que você nunca será perseguido [13]. No entanto, diante de Deus você será um covarde. Veja o que o Senhor falou a respeito disso:

“Portanto, todo aquele que me confessar diante dos homens, também eu o confessarei diante de meu Pai, que está nos céus; mas aquele que me negar diante dos homens, também eu o negarei diante de meu Pai, que está nos céus” (Mt 10.32,33).

3º - Somos perseguidos por nosso relacionamento com Cristo (Mt 5.11). O mundo não odeia o cristão, mas odeia a justiça, odeia Cristo em nós. O mundo odeia a verdade que representamos. Por nos relacionarmos com Cristo o mundo se levantará contra nós. Os cristãos do primeiro século foram perseguidos, afugentados e atormentados, e o resultado disto para alguns foi a prisão e a morte. Veja como Saulo perseguiu a igreja:

“Saulo, respirando ainda ameaças e morte contra os discípulos do Senhor, dirigiu-se ao sumo sacerdote e lhe pediu cartas para as sinagogas de Damasco, a fim de que, caso achasse alguns que eram do Caminho, assim homens como mulheres, os levasse presos para Jerusalém” (At 9.1,2).

O que os perseguidores usarão contra os crentes fiéis?

a) Injúria – Injustiça, aquilo que é injusto; tudo o que é contrário ao direito. No grego essa palavra é oneididzo, que significa jogar na cara. Significa maltratar com palavras vis, cruéis e escarnecedoras. Foi o que fizeram com Jesus quando estava preso na cruz (Mt 27.39-44).

b) Perseguição – Essa palavra vem do grego dioko, que tem a ideia de atormentar ou tratar mal. Uma vida com Deus desperta ódio nos ímpios. É a inimizada da serpente contra a semente sagrada (Mt 10.34-39).

c) Mentira – A mentira é a arma do diabo, pois ele é o pai da mentira. Não se surpreendam, se por vocês serem fiéis a Deus, todo tipo de mentira for levantada contra vocês. 

4º - Como deve ser nossa reação diante da perseguição? (Mt 5.12). O Senhor encerra dizendo: “Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes de vós”.

Como devemos enfrentar a perseguição:

a) Com profunda alegria – Saltai e continuai saltando, porque essa perseguição prova que a vossa religião é verdadeira, que estais realmente prestes a participar do reino. Não temos alegria por causa da perseguição em si, mas porque é sinal dos tempos – isto é, o reino chegou, e também é sinal pessoal – isto é, a vossa religião não é falsa, mas autêntica. Isto nos serve de motivo de alegria [14]. A palavra “exultai” no grego é agalliasthe, que significa saltar, pular, gritar de alegria [15].

Veja o que Pedro nos diz:

“Amados, não estranheis o fogo ardente que surge no meio de vós, destinado a provar-vos, como se alguma coisa extraordinária vos estivesse acontecendo; pelo contrário, alegrai-vos na medida em que sois coparticipantes dos sofrimentos de Cristo, para que também, na revelação de sua glória, vos alegreis exultando” (1Pe 4.13).

Apesar de tudo isso, o Senhor disse que nós somos bem-aventurados, felizes. Não que haja alegria com a perseguição, mas o porquê de ela ocorrer. Veja como reagiram os apóstolos depois que foram açoitados por causa de Cristo:

“Chamando os apóstolos, açoitaram-nos e, ordenando-lhes que não falassem em o nome de Jesus, os soltaram. E eles se retiraram do Sinédrio regozijando-se por terem sido considerados dignos de sofrer afrontas por esse Nome” (At 5.40,41).

b) Com discernimento espiritual. “Porque é grande o vosso galardão nos céus”. O nosso verdadeiro galardão – recompensa por serviços valiosos – não nos é entregue aqui na terra, mas no céu. Veja o que o apóstolo Paulo nos fala em 2Tm 4.7,8:

“Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé. Já agora a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, reto juiz, me dará naquele Dia; e não somente a mim, mas também a todos quantos amam a sua vinda”.

c) Com paciência dos profetas. O Senhor está nos dizendo que fazemos parte da elite dos profetas. Olhe a história de Jeremias, de Daniel, de Isaías; dos profetas pós-exílio. Há uma gana de fé e de esperança que ultrapassa a lógica humana. Mas isso ocorre porque eles estão firmados em Deus e em Sua Palavra. Eles estão firmados nas promessas do Senhor!

Os profetas foram perseguidos e, muitos, foram mortos pelo seu próprio povo. O próprio Senhor Jesus falou de como os judeus agiram com os profetas (Mt 23.29-37).

Passaremos por provações por causa de Cristo, mas a recompensa divina virá. Veja o que nos fala Tiago, irmão do Senhor:

“Meus irmãos, tende por motivo de toda alegria o passardes por várias provações, sabendo que a provação da vossa fé, uma vez confirmada, produz perseverança. Ora, a perseverança deve ter ação completa, para que sejais perfeitos e íntegros, em nada deficientes” (Tg 1.2-4).

Há outra coisa que muitas vezes nós não nos lembramos no momento da provação, é que o nosso testemunho edificará outras pessoas, pois a nossa lealdade é esperança e renovo de fé para muitos que enfrentarão futuras provações. E devemos entender que por mais que soframos, todo sofrimento é leve e momentâneo quando visto à luz da recompensa eterna. Nada nem ninguém poderá nos separar do amor eterno do Pai (Rm 8.35-39).

CONCLUSÃO

Se há algo que o homem mais anseia é a felicidade, e ela nos foi apresentada aqui no Sermão do Monte através das Bem-aventuranças. Sabemos que o mundo não entende como isso é possível, mas para nós, que temos a mente de Cristo, isso deveria ser perfeitamente compreensível.

As Bem-aventuranças só podem ocorrer na vida do cristão que não se embaraça com os negócios desta vida, como disse Paulo a Timóteo: “Ninguém que milita se embaraça com negócios desta vida, a fim de agradar àquele que o alistou para a guerra” (2 Tm 2.4). Em outras palavras, as Bem-aventuranças só pode ser realidade na vida daqueles que se empenham em viver o Evangelho sem hipocrisia e sem máscaras. Um hipócrita não consegue navegar em mares tempestuosos. Ele seguirá Cristo ao Monte das Oliveiras, mas não ao Monte Calvário. O verdadeiro crente carrega a Cristo no coração e cruz nos ombros [16]. Para estes “As Bem-aventuranças” é uma realidade.

Pense nisso! 

Fonte:

1 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 149.
2 – Loyd-Jones, David Martyn. Estudo no Sermão do Monte. Ed. Fiel, São Paulo, SP, 1984: p. 111.
3 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 150.
4 – Ibid; p. 151.
5 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 113.
6 – Stott, John R. W. A Mensagem do Sermão do Monte. ABU, São Paulo, SP, 1986: p. 41.
7 – Ibid; p. 42. 
8 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 121.
9 – Loyd-Jones, David Martyn. Estudo no Sermão do Monte. Ed. Fiel, São Paulo, SP, 1984: p. 119.
10 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 169.
11 – Loyd-Jones, David Martyn. Estudo no Sermão do Monte. Ed. Fiel, São Paulo, SP, 1984: p. 125.
12 – Tasker, R. V. G. Mateus, Introdução e Comentário. Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1985: p. 50.
13 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 172.
14 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado Versículo por Versículo, Vol. 1. Ed. Candeia, São Paulo, SP, 10ª Reimpressão, 1998: p. 307.
15 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 129.
16 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 129.

AS BEM-AVENTURANÇAS - PARTE 2


Por Pr. Silas Figueira

4 – BEM-AVENTURADOS OS QUE TÊM FOME E SEDE DE JUSTIÇA (Mt 5.6).

“Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão fartos”.

Essas três primeiras Bem-aventuranças tratam diretamente do nosso ego – que é o nosso interesse próprio. A primeira fala que devemos ser humildes, no sentido de olharmos para nós mesmos e ver a nossa penúria espiritual e a nossa total dependência de Deus. A segunda nos mostra que diante disso nós choramos de arrependimento devido ao nosso estado pecaminoso, devido a nossa miséria espiritual. Os soberbos não choram; e por fim, nós abrimos mão da nossa vontade própria nos sujeitando a vontade de Deus através da mansidão. Observe que isso é uma sequência, e que a chave que abre todas as outras bem-aventuranças é a pobreza espiritual.

O apóstolo Paulo nos diz que no fim dos tempos, ou, nos últimos dias, sobrevirão tempos difíceis, pois os homens serão egoístas, mas tendo a forma de piedade (2Tm 3.1,2,5). O problema não estará do lado de fora da igreja, mas dentro dela, ou seja, no homem.

Nessa quarta bem-aventurança Jesus fala sobre fome e sede. Jesus estava falando sobre algo que essas pessoas entendiam muito bem este tipo de necessidade. Os verbos no grego são muito fortes. Peinao significa estar necessitado, sofrer de fome profunda. A palavra dipsao traz a ideia de sede de verdade. Lembre-se, esta não é uma exigência apenas para os que estão vindo para o reino, mas também o padrão para os que já estão nele [1].

1º - O que não significa ter fome e sede de justiça na perspectiva bíblica?É não ter fome e sede de bênçãos; e nem nos compete ter fome e sede de felicidade. Ora, o que o mundo anda fazendo é precisamente isso. Todos estão procurando achar a felicidade, porquanto esse é o seu objetivo fixo. No entanto, não encontram a felicidade, pois sempre que alguém põe a felicidade acima da justiça, quanto a ordem de prioridade, tal esforço está condenado ao fracasso mais miserável [2].

Quem busca tal felicidade sem pensar na justiça passa por cima de tudo e de todos. Essa pessoa é extremamente egoísta, ou em outras palavras, um tremendo hedonista. Essa pessoa quer ser feliz e busca a “bênção” sem se importar que para isso tenha de agir de forma injusta com os outros. O que tais pessoas querem é a felicidade a qualquer preço.

2º - O que significa ter fome e sede de justiça na perspectiva bíblica? John Stott diz que a justiça na Bíblia tem pelos menos três aspectos: o legal, o moral e o social [3].

a) A justiça legal é a justificação, é um relacionamento certo com Deus. E eu vou além, isso envolve a santificação também. Por ser o homem um pecador (Rm 3.23), este não é justificado diante de Deus através de sua própria justiça. Por mais que façamos tudo de bom, por mais que andemos de forma a não prejudicar ninguém e façamos o bem a todos, nada disso nos justifica diante de Deus. Essa é a doutrina dos espiritualistas. Eles ensinam que quem age assim será “justificado” na próxima reencarnação.

Cornélio era um homem justo e a sua conduta agradava a Deus, mas tais condutas não lhe garantiam a sua salvação (At 10.1-4; 11.13,14). Isso porque pelas obras ninguém poderá ser justificado diante de Deus, pois o padrão para entrar no céu é a perfeição (Mt 5.48). Como o homem pode ser justo diante de Deus? Aquilo que o homem não podia fazer, Deus fez por ele. Deus enviou Seu Filho ao mundo como nosso representante e fiador. Quando Cristo foi à cruz, Ele foi em nosso lugar [4].

b) A justiça moral é a justiça de caráter; de ter conduta que agrada a Deus. É muito mais que mera moralidade. Ela ultrapassa a boa conduta na sociedade. Não quero com isso dizer que tal coisa seja ruim, não é isso. É que o Evangelho vai muito além disso. É a busca de uma conduta pura que agrada a Deus. Não é uma conduta de fachada como os fariseus viviam, e por isso, foram recriminados pelo Senhor Jesus (Mt 5.20).

Jesus não está falando de justiça moral farisaica, pois quem tem fome e sede de justiça deseja ardentemente ter mente pura, coração puro, vida pura.

c) Justiça social refere-se à busca pela libertação do homem da opressão, junto com a promoção dos direitos civis, da justiça nos tribunais, da integridade nos negócios e da honra no lar e nos relacionamentos familiares. Assim, os cristãos estão empenhados em sentir fome de justiça em toda a comunidade humana para agradar a um Deus justo [5].

A única verdadeira felicidade é ser íntegro com Deus em todas as áreas da vida. É termos a consciência tranquila de que no que depender de nós a injustiça não será aplicada a ninguém.

3º - Alguns problemas graves relacionados ao apetite. Para entendermos o que o Senhor Jesus estava ensinando aos seus discípulos através desta Bem-aventurança. O Reverendo Hernandes Dias Lopes enumera algumas questões graves em relação ao apetite espiritual [6]:

Os mortos não têm apetite. As iguarias da mesa de Deus não despertam nenhum apetite nos espiritualmente mortos. A fome é o primeiro sinal de que uma pessoa está viva.

Falta de apetite é uma doença. Quando as pessoas recusam o alimento, é porque não estão com fome. Quando elas fazem pouco caso do evangelho, é porque estão cheias de si mesmas. Jesus tinha apetite pelas coisas do Pai (Jo 4.34).

A inanição é evidência de uma alimentação escassa. Quando uma pessoa não se alimenta de forma correta ou não recebe alimento suficiente para atender as suas necessidades, ficam fracas, desnutridas e, consequentemente, não se desenvolvem. Muitos pregadores inescrupulosos e gananciosos criam suas próprias igrejas como empresa familiar. Fazem do púlpito um balcão, do evangelho, um produto, do povo, uma clientela. Vendem por dinheiro a graça de Deus e pelo lucro a consciência. Torcem a verdade, pregam outro evangelho que na verdade não é evangelho de Cristo, e enganam os incautos com promessas mirabolantes de riquezas e glórias neste mundo.

Muitas doenças são provocadas por uma alimentação inadequada. Ninguém pode ter boa saúde se tem uma péssima alimentação. Não há nada mais nocivo à saúde do que ingerir um alimento estragado ou venenoso. Um falso evangelho é veneno.

A desnutrição produz raquitismo. Uma pessoa que não recebe alimento saudável e suficiente pode sofrer de raquitismo. Seus membros ficam atrofiados e seu desenvolvimento, comprometido. As igrejas que abandonam o genuíno evangelho em busca de novidades precisam ter muita criatividade. As novidades são como goma de mascar. No começo é gostoso, doce. Depois, o açúcar acaba e a pessoa começa a mascar borracha.

4º - Os que têm fome e sede de justiça não aceitam a injustiça. Os que verdadeiramente tem fome e sede de justiça, não somente evitam as coisas que sabem serem más e prejudiciais, como também evitam as coisas que contribuem para embotar nosso apetite espiritual [7]. Por isso que o Senhor disse que os que tem fome e sede de justiça serão fartos. Fartos é uma palavra forte. É usada para descrever o ato de alimentar um animal. Significa estar totalmente satisfeito. Deus quer nos fazer felizes e satisfeitos. Satisfeitos do que temos fome e sede. Satisfeitos de justiça [8].

Vivemos num mundo onde reina a injustiça em todos ramos da sociedade. O que mais temos contemplado são juízes julgando em causa própria. A injustiça prevalecendo cada dia mais. A impressão que temos é que isso nunca terá fim. Mas haverá um dia em que a justiça de Deus será totalmente aplicada, essa injustiça que reina não é eterna. Veja o que o Senhor nos fala em Apocalipse 6.9-11:

“Quando ele abriu o quinto selo, vi, debaixo do altar, as almas daqueles que tinham sido mortos por causa da palavra de Deus e por causa do testemunho que sustentavam. Clamaram em grande voz, dizendo: Até quando, ó Soberano Senhor, santo e verdadeiro, não julgas, nem vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a terra? Então, a cada um deles foi dada uma vestidura branca, e lhes disseram que repousassem ainda por pouco tempo, até que também se completasse o número dos seus conservos e seus irmãos que iam ser mortos como igualmente eles foram”.

Os que têm fome e sede de justiça são os que, por ansiarem por ver o triunfo de Deus sobre o mal e o seu reino plenamente estabelecido, anseiam também por fazer eles próprios o que é justo e reto [9]. Aquele que tem fome e sede de justiça será farto agora e na eternidade, na terra e também no céu.

5 – BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS (Mt 5.7).

“Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia”.

Os misericordiosos são aqueles que estão conscientes de ser indignos recipientes da misericórdia de Deus e que, não fosse por essa misericórdia, eles não seriam apenas pecadores, mas pecadores condenados. Consequentemente esforçam-se por refletir no seu convívio com outros algo da misericórdia que Deus mostrou para com eles. E quanto mais fazem isto, mais a misericórdia de Deus se estende sobre eles [10].

Esta bem-aventurança trata da nossa da nossa ação diante dos homens. Podemos dizer que as primeiras bem-aventuranças tratam da questão do ser, esta trata da questão do fazer. De como pôr em prática o que somos diante de Deus. No cristianismo o ser vem antes do fazer. Quem é, faz. A fé sem obras é morta (Tg 2.17) [11].

1º - Nem sempre a misericórdia recebida é a misericórdia dada. Há muitas pessoas que recebem misericórdia, mas não compartilham a misericórdia recebida. Tais pessoas são egoístas e perversas. Um psicopata não tem misericórdia. Tal pessoa é como o Mar Morto, só recebe água doce, mas não a tem para dar.

Como algumas pessoas deixam de demonstrar a misericórdia recebida? Vamos enumerar algumas situações.

a) Quando a pessoa tem prazer em desmerecer o nome das outras pessoas. Há pessoas que o prazer delas é destruir a reputação dos outros. Isso é uma grande crueldade. Isso demonstra inveja e orgulho. Pessoas que, muitas vezes, têm até mais do que nós, mas o prazer delas é que não tenhamos nada, principalmente boa reputação. O bom nome vale mais do que as riquezas (Pv 22.1). Quem não tem misericórdia espalha boatos falsos e maliciosos. São caluniadores. A palavra grega para caluniador é diabolos (1Tm 3.11).

b) Quando expomos os erros dos outros. Como disse Jesus: “Aquele que dentre vós  estiver sem pecado seja o primeiro que lhe atire a pedra” (Jo 8.7). Se há pessoas que gostam de destruir a reputação dos outros, há os que gostam de espalhar o pecado dos outros. Isso geralmente ocorre porque as pessoas que espalham os erros dos outros se sentem muito mais santas. Se sentem melhores que as outras. Tem gente que é igual urubu, tem uma atração mórbida por aquilo que cheira mal.

c) Quando passamos adiante o que ouvimos dos caluniadores. Isso se chama fofoca. E a Bíblia nos exorta a não andarmos com mexeriqueiros (Lv 19.16):

“Não andarás como mexeriqueiro entre o teu povo; não atentarás contra a vida do teu próximo. Eu sou o SENHOR”.

Veja também o que nos diz Êxodo 23.1:

“Não espalharás notícias falsas, nem darás mão ao ímpio, para seres testemunha maldosa”.

Pessoas que agem assim são pessoas sem misericórdia. É gente usada pelo diabo para tentar destruir a vida alheia. E pior que isso, sempre tem aquele que ainda diz: “Onde há fumaça há fogo”.

Veja o que nos fala Provérbios 6.16-19:

“Seis coisas o SENHOR aborrece, e a sétima a sua alma abomina: olhos altivos, língua mentirosa, mãos que derramam sangue inocente, coração que trama projetos iníquos, pés que se apressam a correr para o mal, testemunha falsa que profere mentiras e o que semeia contendas entre irmãos”.

d) Quando nos calamos diante das calúnias. Tem gente que ouve a calúnia, sabe que não é verdade, mas não fala nada. Ser misericordioso é defender o direito das outras pessoas.

2º - A misericórdia recebida é a misericórdia dada. O maior exemplo de misericórdia foi demonstrado por Jesus. Ele curou os doentes, alimentou os famintos, abraçou as crianças, foi amigo dos pecadores, tocou os leprosos. Ele fez com que os solitários se sentissem amados. Ele consolou os aflitos, perdoou os pecados e restaurou os que haviam caído em opróbio [12]. Mas ele deu uma ordem direta em relação a essa misericórdia recebida, Ele disse para os discípulos agirem da mesma forma (Mt 10.8).

O Evangelho põe toda a sua ênfase sobre a questão do ser, e não sobre a questão do fazer, mas no momento em que eu sou eu faço. Vemos como exemplo a parábola do Bom Samaritano (Lc 10.25-37). Essa parábola demonstra a misericórdia em ação. É isso que significa ser misericordioso. Não está envolvido o mero sentimento de compaixão; mas também há um profundo desejo, e até mesmo ação, para que a situação afetiva seja aliviada [13]. Trazendo para os dias de hoje esta parábola, podemos dizer que passou o pastor, depois passou o diácono mas não ajudaram o pobre homem, aí passou um não crente e se compadeceu dele.

Misericórdia envolve empatia e não simpatia, por isso que a misericórdia não é uma virtude natural. Por natureza o homem é mau, cruel, insensível, egoísta, incapaz de exercer a misericórdia. Você precisa nascer de novo antes de ser misericordioso.

Em outras palavras, Jesus estava lhes dizendo: “As pessoas no meu reino não recebem; elas dão. As pessoas no meu reino não se colocam acima dos outros – são pessoas que se curvam” [14].

3º - As recompensas prometidas aos misericordiosos: “alcançarão misericórdia”.  Antes de falarmos de recompensas, é bem deixar claro que não somos merecedores de nada. Como disse John Stott: “Não que possamos merecer a misericórdia através da misericórdia, ou o perdão através do perdão, mas porque não podemos receber a misericórdia e o perdão de Deus se não nos arrependermos, e não podemos proclamar que nos arrependemos de nossos pecados se não formos misericordiosos com os pecados dos outros” [15].

a) Alcançarão misericórdia porque que a misericórdia é uma via de mão dupla. Nós recebemos de Deus o que nós damos para os outros, e damos para os outros o que recebemos de Deus. Somente as pessoas que percebem verdadeiramente sua posição diante de Deus, de seu relacionamento com Deus, é que necessariamente sentem compaixão por seus semelhantes.

b) Alcançarão misericórdia não dos homens, mas de Deus. Não se surpreenda se a pessoa com a qual você agiu com misericórdia te decepcione. Isso, infelizmente, é a coisa mais comum que existe. Jesus foi a pessoa mais misericordiosa que já existiu, e o povo clamou por seu sangue. Ninguém se levantou para defende-Lo, nem seus discípulos, nenhuma das pessoas que Ele curou, nenhum ex-leproso se colocou como advogado de defesa do Nosso Senhor. Ele não recebeu misericórdia alguma das pessoas a quem distribuiu misericórdia [16].  

Nós alcançaremos misericórdia vinda da parte de Deus, pois somente Ele pode ser misericordioso de forma plena. Não quero com isso dizer que todas as pessoas com quem usarmos de misericórdia serão injustos conosco, não é isso. Eu quero dizer que devemos ser misericordiosos com todos, mas esperar do Senhor a recompensa.

6 – BEM-AVENTURADOS OS LIMPOS DE CORAÇÃO (Mt 5.8).

“Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão a Deus”.

O Secretário Geral do Partido Comunista, Nikita Kruschev, em um discurso antirreligioso em um plenário do Comitê Central da União Soviética disse: “Gagarin voou ao espaço, mas não viu nenhum Deus ali”. Outros dizem que está frase pertence ao próprio Yuri Gagarin – o primeiro homem (cosmonauta) a ir ao espaço. Mas, segundo Jesus, para vermos a Deus não é necessário irmos ao espaço sideral, para tal devemos sim ter um coração limpo.

Antes de entendermos o que vem a ser um coração limpo, devemos entender o que vem a ser a palavra coração segundo a Bíblia.

1º - O vocábulo coração segundo a Bíblia. Em termo geral, o coração é tido como o centro da personalidade. Não indica meramente a sede dos afetos e das emoções. Esta bem-aventurança não é uma declaração que vise dizer que a fé cristã é algo primariamente emocional, e não intelectual ou pertencente ao terreno da vontade. De maneira nenhuma! Nas Escrituras, a palavra “coração” envolve todos esses três conceitos. O coração é o centro do ser e da personalidade do indivíduo; é igualmente a fonte de onde brota tudo quanto daí se segue. Inclui a mente. Inclui a vontade. Inclui as emoções. Essa palavra considera o homem em sua totalidade [17].

Jesus está ressaltando que a pureza deve penetrar em todos os recônditos da nossa vida: nossos pensamentos, emoções, motivações, desejos e vontade. A Bíblia diz: “Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida” (Pv 4.23) [18].

2º - O coração é um manancial de impureza (Mt 15.19). O Senhor Jesus em Mateus 15.19 nos diz assim: “Porque do coração procedem maus desígnios, homicídios, adultérios, prostituição, furtos, falsos testemunhos, blasfêmias”.

Não é o meio em que vive que contamina o homem, o homem é mau por natureza. O problema não está do lado de fora, mas do lado de dentro, ou seja, dentro do coração. É só ver que o Adão caiu estando em um ambiente totalmente limpo do pecado, mas lá caiu. Jeremias 17.9 também nos diz algo semelhante:

“Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá?”

O coração do homem em resultado da queda, em resultado do pecado, como nos diz as Escrituras é desesperadamente corrupto. Por isso que em Ezequiel 11.19,20 nos diz:

“Dar-lhes-ei um só coração, espírito novo porei dentro deles; tirarei da sua carne o coração de pedra e lhes darei coração de carne; para que andem nos meus estatutos, e guardem os meus juízos, e os executem; eles serão o meu povo, e eu serei o seu Deus”.

Davi também disse algo semelhante no Salmo 51.10:

“Cria em mim, ó Deus, um coração puro e renova dentro de mim um espírito inabalável”.

3º - O que vem a ser “limpos de coração?”. Para entendermos o que o Senhor disse que bem-aventurado são os limpos de coração, devemos entender o que não é essa limpeza.

a) Não é uma limpeza cerimonial. Na versão ACF diz: “Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus”. Observe que diz que “eles” verão a Deus. Essa palavra “eles” no grego é autoi, que significa apenas eles, ou seja, somente os limpos de coração. O Senhor aqui está colocando em xeque a ideia que os fariseus tinham de achar que eles é que eram puros, pois afinal de contas eles se purificavam cerimonialmente sempre. Eles eram criteriosos quanto a cumprirem determinadas práticas como o lavar as mãos, vasos e panelas, no entanto o Senhor disse para eles em Mateus 23.27:

“Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque sois semelhantes aos sepulcros caiados, que, por fora, se mostram belos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda imundícia!”

Há pessoas que são como os fariseus, pensam que podem se purificar cerimonialmente sem serem limpos de coração.

b) O sentido bíblico para limpos de coração. A palavra “limpos” no grego é “kátaros”, que aqui nos dá a ideia de ser limpo de toda hipocrisia, ou seja, é uma total devoção sem a pessoa estar dividida. É um coração sincero. O coração limpo é um coração totalmente entregue a Deus, e por estar entregue a Deus ele está limpo de toda e qualquer contaminação. E quando se contamina, busca de Deus o perdão de seus pecados, pois reconhece o seu estado (1Jo 1.9).

c) Como podemos purificar o nosso coração? Se o nosso coração é tão terrível como a Bíblia descreve, como posso então ter um coração limpo? De que forma isso pode ocorrer? Creio que para essas perguntas há três respostas.

1 – Através do verdadeiro arrependimento. Tanto que o Senhor Jesus começou o seu ministério dizendo: “Daí por diante, passou Jesus a pregar e a dizer: Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus” (Mt 4.17).

A solução de Deus para o coração pecaminoso e a regeneração, é o nascer de novo, é voltar-se para Deus pela “fé”, e aceitar Jesus Cristo como seu Salvador e Senhor pessoal. O coração que experimenta o novo nascimento de Deus tem o desejo de amar e obedecer. Este tem um novo coração.

Através do arrependimento o Espírito Santo habita em nós e Ele purifica-nos dos pecados. Somente a Sua presença no íntimo pode limpar-nos o coração. Ele faz isso operando em nós “tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade” (Fl 2.13).

2 – Observando a Palavra de Deus. O Salmo 119.9 diz: “De que maneira poderá o jovem guardar puro o seu caminho? Observando-o segundo a tua palavra”.

Jesus orou ao Pai pedindo que nos santificasse na verdade, pois a Palavra de Deus é a verdade (Jo 17.17). A Bíblia é como um espelho que mostra o nosso estado espiritual. Quando eu a leio eu me vejo como na verdade eu estou.

3 – Confessando sempre os pecados a Deus. O texto de João nos fala duas vezes a respeito disto. Veja em 1Jo 1.7,9:

“Se, porém, andarmos na luz, como ele está na luz, mantemos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo pecado. Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça”.

Através da confissão dos nossos pecados o Senhor nos purifica dos nossos pecados através do sangue de Jesus. Através do sangue d Jesus derramado na cruz os nossos pecados foram lavados. A Bíblia nos diz que Jesus levou sobre si os nossos pecados:

“Carregando ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados, para que nós, mortos para os pecados, vivamos para a justiça; por suas chagas, fostes sarados” (1Pe 2.24).

4º - A recompensa de ter um coração puro. A gloriosa recompensa dos puros de coração é que eles verão a Deus. O verbo grego está no futuro contínuo. Em outras palavras: “Eles verão continuamente a Deus” [19]. Hoje nós vemos a Deus pela fé, mas chegará o dia em que o veremos face a face, como nos fala João em sua primeira carta:

“Amados, agora, somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que haveremos de ser. Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque haveremos de vê-lo como ele é” (1Jo 3.2).

Aqueles que não têm o coração puro não verão a Deus, pois a Bíblia diz que, sem santificação, ninguém verá a Deus (Hb 12.14). Aqueles que se recusam a ser lavados no sangue do Cordeiro serão banidos para sempre da face do Senhor e viverão para sempre nas trevas exteriores, onde há choro e ranger de dentes. Deus é luz, Deus é amor. Longe de Deus só reinam treva e ódio. Os limpos de coração verão a Deus. Mais do que tesouros, mais do que glórias humanas, nossa maior recompensa é Deus. Ele é melhor do que as suas dádivas. Ele é a nossa herança, a nossa recompensa. Teremos a Deus, veremos a Deus por toda a eternidade! Oh, que glória isso será! [20].

Fonte:

1 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 104. 
2 – Loyd-Jones, David Martyn. Estudo no Sermão do Monte. Ed. Fiel, São Paulo, SP, 1984: p. 68. 
3 – Stott, John R. W. A Mensagem do Sermão do Monte. ABU, São Paulo, SP, 1986: p. 34. 
4 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 63. 
5 – Stott, John R. W. A Mensagem do Sermão do Monte. ABU, São Paulo, SP, 1986: p. 35. 
6 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 67,68. 
7 – Loyd-Jones, David Martyn. Estudo no Sermão do Monte. Ed. Fiel, São Paulo, SP, 1984: p. 82. 
8 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 109. 
9 – Tasker, R. V. G. Mateus, Introdução e Comentário. Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1985: p. 49. 
10 – Ibid; p. 50. 
11 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 81. 
12 – Ibid; p. 82. 
13 – Loyd-Jones, David Martyn. Estudo no Sermão do Monte. Ed. Fiel, São Paulo, SP, 1984: p. 91. 
14 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 119. 
15 – Stott, John R. W. A Mensagem do Sermão do Monte. ABU, São Paulo, SP, 1986: p. 38. 
16 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 118. 
17 – Loyd-Jones, David Martyn. Estudo no Sermão do Monte. Ed. Fiel, São Paulo, SP, 1984: p. 101. 
18 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 96. 
19 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 147. 
20 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 107.

sábado, 21 de outubro de 2017

AS BEM-AVENTURANÇAS - PARTE 1


Por Pr. Silas Figueira

Texto base: Mateus 5.1-5

INTRODUÇÃO

As Bem-aventuranças talvez seja um dos textos mais controversos nos ensinos de Jesus (isso para não dizer todo o Sermão do Monte), porque Ele diz que feliz é – aos olhos do mundo – os infelizes. É aquele que anda na contramão do que a nossa cultura secular ensina. É um viver inconformado. É a não sujeição aos princípios impostos pelo mundo.

É o que o apóstolo Paulo nos fala em 1 Coríntios 2.14:

“Ora, o homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente”.

É exatamente isso que as Bem-aventuranças nos mostra de forma plena, que é impossível ao homem natural entender as coisas do Espírito de Deus, pois elas se discernem espiritualmente. As Bem-aventuranças não são qualidades inatas ou adquiridas pelo esforço humano. Nenhum homem poderia possuir essas bem-aventuranças à parte da graça de Deus. As bem-aventuranças não são retribuições dos méritos humanos, mas um presente da graça divina [1].

O texto que lemos nos diz que Jesus subiu a um monte para ensinar, pois o que Ele tinha para dizer transcendia à vida comum do vale interior, onde os homens estavam acostumados a reunir-se [2]. Assim como Moisés subiu ao Monte Sinai para receber do Senhor a Lei e transmiti-la ao povo hebreu, o Senhor Jesus agora sobe a um monte para fazer a transição da Lei para o Evangelho para ser transmitida ao mundo. O que o Senhor Jesus está para fazer será uma mudança drástica para todo o povo, que redundará em toda a mensagem do Novo Testamento – em toda a sua doutrina e teologia. Como disse João em seu Evangelho:

“Porque a lei foi dada por intermédio de Moisés; a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo” (Jo 1.17).

Vemos por exemplo que Malaquias 4.6, a última mensagem no Antigo Testamento encerra com a palavra maldição. Interessante. O Antigo Testamento termina com uma maldição; o Novo Testamento começa com uma benção. Há uma mudança drástica. Encontramos no Antigo Testamento: a lei, o Sinai, trovões, raios, juízo e maldição. No Novo Testamento: Sião, graça, paz, bênção [3].

É interessante observar que na “Vulgata Latina” de Jerônimo (410 d.C), os versículos 3-12 são conhecidos ou traduzidos como beatitudes porque a palavra makarios no grego foi traduzida como “beatos” [4]. Por isso que os católicos chamam os fiéis devotos de beatos (as).

Como falamos, a palavra bem-aventurado vem do grego makarios, um adjetivo que basicamente significa feliz ou aquele que desfruta da felicidade celestial. A palavra vem da raiz makar, que significa ser feliz, mas não no sentido usual de felicidade, baseado em circunstâncias positivas. Makarios descreve a alegria interior que é a realização de todos os anseios no coração humano [5]. E esta felicidade é o resultado de um relacionamento adequando com Deus, com nós mesmos e com o próximo. As Bem-aventuranças apontam para esse tríplice relacionamento [6].

Lloyd-Jones disse que as Bem-aventuranças não pertencem a um grupo seleto de cristãos. Ela não pertence a classe sacerdotal e não aos leigos; aos cristãos excepcionais e não aos cristãos comuns; aqueles que se dizem vocacionados à vida religiosa e não aqueles que se ocupam nas tarefas seculares. Na Bíblia não há distinção como essas [7]. Na verdade, todos os cristãos devem manifestar-se com todas essas qualidades.

Ainda a nível de introdução, as Bem-aventuranças em Mateus parecem ser oito em número, pois no verso 11 Jesus abandona a forma exclamatória “bem-aventurados os” e aborda os discípulos diretamente com as palavras Bem-aventurados sois (vós). As oito qualidades aqui indicadas, quando integradas umas às outras formam o caráter daqueles que, únicos, serão aceitos pelo divino Rei como súditos (3, 10), os únicos que o poderão ver, sendo ele invisível (8), os únicos dignos de serem seus filhos (9) [8].

As bem-aventuranças descrevem o caráter equilibrado e diversificado do povo cristão. Não existem oito grupos separados e distintos de discípulos, alguns dos quais são mansos, enquanto outros são misericordiosos e outros, ainda, chamados para suportar perseguições. São, antes, oito qualidades do mesmo grupo de pessoas que, ao mesmo tempo, são mansas e misericordiosas, humildes de espírito e limpas de coração, choram e têm fome, são pacificadoras e perseguidas [9]. As Bem-aventuranças é como o fruto do Espírito (Gl 5.22,23), impossível de separá-la. Assim como o fruto é um só, as Bem-aventuranças também.

Jesus é enfático ao afirmar que o cristão é feliz, muito feliz! Sua felicidade é pura, profunda e eterna. O mundo não pode concedê-la nem retirá-la. Ela começa na terra e continua no céu por toda a eternidade [10].

Desde o início, o Sermão do Monte nada tem a oferecer para alguém que não tem fé em Jesus Cristo. Mas, para aqueles que conhecem e amam o Senhor Jesus, para aqueles que pela fé se tornam coparticipantes da natureza divina, o mesmo gozo, o mesmo contentamento, a mesma alegria, o mesmo sentimento de makarios, que é fundamentalmente um elemento do caráter de Deus e de Cristo, são nossos. Assim, quando falamos de felicidade ou bem-aventurança, estamos abordando o tema dentro de um contexto bíblico e não nos referindo a uma atitude superficial baseada em circunstâncias [11].

Vamos analisar as Bem-aventuranças para saber o que elas têm a nos ensinar.

1 – BEM-AVENTURADO OS HUMILDES DE ESPÍRITO (Mt 5.1-3).

“Vendo Jesus as multidões, subiu ao monte, e, como se assentasse, aproximaram-se os seus discípulos; e ele passou a ensiná-los, dizendo: Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus”.

Jesus foi o maior pregador da história pela sublimidade de Seu ensino, a excelência dos Seus métodos e a grandeza incomparável de Seu caráter. Jesus o maior pregador fala sobre a verdadeira felicidade, o cristianismo é a religião do prazer e da felicidade [12]. E Ele começa dizendo algo que entra em choque com tudo que o mundo ensina. Enquanto que os hedonistas buscam o prazer a qualquer custo, Jesus começa ensinando que o não ter nada é o que traz felicidade. No entanto, esta é a chave para entendermos o que vem em seguida. No reino de Deus não existe sequer um participante que não seja “humilde de espírito”. Esta é a característica fundamental do crente, do cidadão do reino dos céus; e todas as demais características são, em certo sentido, resultados dessa primeira qualidade [13].

1º - O que significa ser humilde de espírito. A palavra humilde (pobre) de espírito vem do grego ptokós, um substantivo que significa desprovido das riquezas do mundo; o termo descreve um mendigo, desesperadamente envergonhado até para deixar que sua identidade seja revelada. O termo não se refere apenas ao conceito de pobre, a palavra para pobreza comum era penace, que significa uma pessoa que tem que trabalhar para conseguir a sua sobrevivência [14]. O pobre aqui é uma pessoa desprovida de tudo, que vive na total dependência dos outros. Que vive na total penúria.

2º - Ser humilde (pobre) de espírito é reconhecer nossa total dependência de Deus. Como diz na Vulgata Latina: “beati pauperes spiritu”. É reconhecer nossa total pobreza espiritual ou, falando claramente, a nossa total falência espiritual diante de Deus, e nada merecemos além do juízo de Deus. Nada temos a oferecer, nada temos a reivindicar, nada com que comprar o favor dos céus [15].

Deus se identifica com pessoas que mendigam em seu interior, não com pessoas que são autossuficientes, que pensam que podem ganhar sua própria salvação [16].

3º - Ser humilde (pobre) de espírito é se ver face a face com Deus. Quem se vê face a face com Deus age como Isaías agiu quando viu a glória do Senhor no templo (Is 6.1-5). Como disse Calvino: “Só aquele que, em si mesmo, foi reduzido a nada, e repousa na misericórdia de Deus, é pobre de espírito”.

Nos tempos de nosso Senhor, quem entrou no reino não foram os fariseus, que se consideravam ricos, tão ricos em méritos que agradeciam a Deus por seus predicados; nem os zelotes, que sonhavam com o estabelecimento do reino com sangue e espada; mas foram os publicanos e as prostitutas, o refugo da sociedade humana, que sabiam que eram tão pobres que nada tinham para oferecer nem para receber. Tudo o que podiam fazer era clamar pela misericórdia de Deus; e Ele ouviu o seu clamor [17].

4º - Só os humildes (pobres) de espírito herdam o reino dos céus. O Reino dos Céus não é tomado a força, mas é conquistado com submissão a vontade de Deus. Para herdar o Reino dos Céus é preciso entender e aceitar que pelos méritos de Cristo que entraremos lá. Nada temos a reivindicar, exigir, reclamar. É esvaziar o coração de toda e qualquer vaidade. É se colocar como Jó diante do Senhor e dizer: “Por isso me abomino e me arrependo no pó e na cinza” (Jó 42.6). 

2 – BEM-AVENTURADOS-AVENTURADOS OS QUE CHORAM (5.4).

“Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados”.

Quase que poderia traduzir esta segunda bem-aventurança por “Felizes os infelizes”, a fim de chamar a atenção para o surpreendente paradoxo que contém [18]. Jesus não está dizendo aqui que sobre os que choram por motivo de alguma tristeza é que são felizes, como se esse chorar fosse um sentimento de pesar devido à perda de algum ente querido. O Senhor está falando no sentido espiritual. São os que choram em seu espírito. E o que isso quer dizer?

1º - Bem-aventurado é aquele que chora devido ao seu pecado. São os que lamentam tanto os seus próprios pecados e falhas, como o mal tão preponderante no mundo, causando tanto sofrimento e miséria [19]. É o choro devido ao arrependimento. Isso só ocorre devido a primeira bem-aventurança, quando somos pobres de espírito. Os soberbos não choram, não se lamentam, não se veem como pecadores. Antes, se veem como as pessoas mais corretas do mundo, as pessoas ao seu redor é que são pecadoras.

2º - Os que choram, choram os pecados alheios. Os que choram reconhecem os seus pecados, mas também lamentam os pecados e misérias em outras pessoas. Ele contempla a desordem e infelicidade das pessoas ao seu redor e a do mundo como um todo. São os pais que choram os pelos pecados dos filhos.

3 º - O Choro pelo pecado é fruto de arrependimento devido ao novo nascimento. Quem não nasceu de novo não sente arrependimento pelo pecado, pois para ele o pecado é algo natural. Só quem é nascido de novo chora o choro do arrependimento e confessa o seu pecado. Veja o que Davi no Salmo 32.1-5,11 nos fala:

“Bem-aventurado aquele cuja iniquidade é perdoada, cujo pecado é coberto. Bem-aventurado o homem a quem o SENHOR não atribui iniquidade e em cujo espírito não há dolo. Enquanto calei os meus pecados, envelheceram os meus ossos pelos meus constantes gemidos todo o dia. Porque a tua mão pesava dia e noite sobre mim, e o meu vigor se tornou em sequidão de estio. Confessei-te o meu pecado e a minha iniquidade não mais ocultei. Disse: confessarei ao SENHOR as minhas transgressões; e tu perdoaste a iniquidade do meu pecado. Alegrai-vos no SENHOR e regozijai-vos, ó justos; exultai, vós todos que sois retos de coração”.

4º - Os que assim choram são consolados. Esse consolo vem da parte de Deus como sinal de arrependimento devido ao reconhecimento do pecado cometido. Os que choram são consolados porque são os únicos que são perdoados [20].

Temos visto muito choro em muitas igrejas, mas não choro devido ao arrependimento devido ao reconhecimento de pecado, pois sermões sobre pecado e arrependimento não tem sido pregado em muitas igrejas. As lágrimas que temos visto é choro de emoção devido ao sofrimento que muitos tem enfrentado, é um choro devido a dor que os sufoca; mas em momento algum não há um choro e grito como o apóstolo Paulo manifestou em Romanos 7.24: “Miserável homem que sou!”. Essas pessoas choram porque se veem como vítimas e não como pecadoras.

3 – BEM-AVENTURADOS OS MANSOS (Mt 5.5).

“Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra”.

Se queremos aprender sobre mansidão, devemos aprender com o Senhor Jesus, pois Ele mesmo nos disse: “e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração” (Mt 11.28). E essas são as duas coisas que o mundo não nos incentiva a sermos. Para o mundo bem-aventurados são os poderosos, os arrogantes, os que dominam sobre os outros. Por isso que Jesus frustrou as expectativas do Seu povo. Eles esperavam um Messias que os iria conduzir em triunfo bélico e não a agir dessa forma.

1º - O que significa ser manso na perspectiva bíblica? O termo grego para manso é praos e significa, basicamente, “brando, dócil e terno”.

Analisemos o termo manso do ponto de vista do uso que os gregos faziam. Um potro selvagem causa uma destruição. Um potro domado é útil. Uma brisa suave refresca e alivia. Um furacão mata. A mansidão é o oposto da violência e da vingança. O homem manso aprendeu a aceitar com alegria o despojo de seus bens, consciente de que tem um bem maior, um bem mais duradouro, com Deus (Hb 10.34). O manso morreu para si mesmo. Nunca se preocupa com as próprias ofensas. Não guarda rancores [21].

Para exercermos essa mansidão é necessário muita coragem e um autocontrole que só o Espírito Santo pode nos dar. Veja o que nos fala Pedro em sua primeira carta:

“Porquanto para isto mesmo fostes chamados, pois que também Cristo sofreu em vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes os seus passos, o qual não cometeu pecado, nem dolo algum se achou em sua boca; pois ele, quando ultrajado, não revidava com ultraje; quando maltratado, não fazia ameaças, mas entregava-se àquele que julga retamente” (1Pe 2.21-23).

Isso é mansidão. E para estes, Deus prometeu a terra.

2º - Ser manso é se submeter à vontade de Deus. É uma pessoa que é submissa à vontade de Deus sem murmuração, mas se sujeita a sua vontade com alegria.

A mansidão é compatível com grande força de caráter. A mansidão é compatível com grande autoridade e poder. O homem manso é alguém que acredita em defender com tal empenho a verdade que se dispõe até a morrer por ela, se for necessário. Os mártires foram pessoas mansas, mas jamais foram débeis. Foram homens fortes, e, contudo, mansos [22].

3º - Ser manso é retribuir o mal com o bem. É não ser vingativo, mas confiar no justo juiz de nossas almas. É entregar para Deus as nossas causas, sabendo que Ele sabe o que faz, ainda que as coisas não saiam como gostaríamos. Isso não quer dizer que não devemos buscar os nossos direitos, eu estou falando em não ser vingativo. Em fazer justiça com as próprias mãos.

Pagar o mal com o mal é agir como um selvagem. Pagar o bem com o mal é agir como um demônio. Pagar o mal com o bem é agir como um cristão, como uma pessoa mansa [23]. Como nos disse Pedro:

“Não pagando mal por mal ou injúria por injúria; antes, pelo contrário, bendizendo, pois para isto mesmo fostes chamados, a fim de receberdes bênção por herança” (1Pe 3.9).


4º - Qual a recompensa dos mansos? O Senhor Jesus nos diz que os mansos herdarão a terra. Herdar é uma promessa futura. O Senhor nos falou de novo céu e nova terra (Ap 21-22). Essa nova terra não é conquistada à força, mas se sujeitando em perfeita mansidão a vontade de Deus. 

Fonte:

1 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 11.
2 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado Versículo por Versículo, Vol. 1. Ed. Candeia, São Paulo, SP, 10ª Reimpressão, 1998: p. 300.
3 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 33.
4 – Stern, David H. Comentário Judaico do Novo Testamento. Ed. Atos, Belo Horizonte, MG, 2008: p. 49.
5 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 33.
6 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 12.
7 – Loyd-Jones, David Martyn. Estudo no Sermão do Monte. Ed. Fiel, São Paulo, SP, 1984: p. 29.
8 – Tasker, R. V. G. Mateus, Introdução e Comentário. Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1985: p. 49.
9 – Stott, John R. W. A Mensagem do Sermão do Monte. ABU, São Paulo, SP, 1986: p. 19.
10 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 11.
11 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 35. 
12 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 12.
13 – Loyd-Jones, David Martyn. Estudo no Sermão do Monte. Ed. Fiel, São Paulo, SP, 1984: p. 37.
14 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 53. 
15 – Stott, John R. W. A Mensagem do Sermão do Monte. ABU, São Paulo, SP, 1986: p. 29.
16 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 54.
17 – Stott, John R. W. A Mensagem do Sermão do Monte. ABU, São Paulo, SP, 1986: p. 29.
18 – Ibid; p. 30.
19 – Tasker, R. V. G. Mateus, Introdução e Comentário. Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1985: p. 49.
20 – MacArthur Jr, John. O Caminho da Felicidade. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001: p. 70. 
21 – Ibid; p. 88.
22 – Loyd-Jones, David Martyn. Estudo no Sermão do Monte. Ed. Fiel, São Paulo, SP, 1984: p. 61.
23 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance, uma exposição das bem-aventuranças. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008: p. 56.